O mundo editorial vive uma problemática cada vez mais acutilante, pertinente e actual. Do monopólio absoluto do formato livro que remonta à Galáxia Gutenberg – deixemos para trás todos os suportes escritos de tempos mais antigos para nos atermos à edição livreira – até uma nova Galáxia – será ainda Marconi? – medeiam alguns séculos. Nas últimas décadas, tudo se transformou e tão rapidamente que se torna impossível acompanhar as ofertas que a tecnologia nos oferece a cada momento. No entanto, se esta velocidade da evolução tecnológica desencadeia uma problematização do que será «o nosso mundo mais imediato», não deixa de proporcionar novas potencialidades e oportunidades. Por exemplo, a democratização do acesso às TIC pode facilitar o e-Learning, não apenas institucional, mas, e é o que pretendo realçar, a curiosos de todos os lugares e idades. E os meios são espantosamente variados e numerosos. É aqui que surge, então, o desafio dos e-books. Em conversa informal e recente com um editor, coloquei-lhe directamente a questão: «Como encara o desenvolvimento dos e-books?». A resposta veio célere: «Parece-me que a complementaridade será a dominante. No entanto, penso que a nível técnico e científico o mundo digital ganhará cada vez mais terreno. Também o mundo da literatura – aqueles romances, tipo ‘descartáveis’ – serão um potencial. Mas os clássicos, aí o formato papel será preponderante.» E não discorremos nada mais sobre o assunto. Portanto, há nichos de mercado que vão desaparecer mas outros resistirão. Como? A adaptação será uma constante da vida. Convém, contudo, ter presente que há sempre o «outro lado», isto é, há vantagens e desvantagens para ambos os lados. E há sempre uma grande variedade de hipóteses que podemos estender até ao infinito… Basta ter presente, nesta linha, as potencialidades que o computador pode retirar da leitura de poemas ou outros textos literários. Basta ter presente o que expõe Manuel Portela: “As animações em computador dos textos de Melo e Castro são tão espectaculares que se pode dizer que esses textos parecem ter estado à espera dos media electrónicos”. Os textos concretos sofrem transformações com a sua computorização permitindo um manancial de abordagens sempre novas e ricas. Para além de se poderem fazer associações de vária ordem, cativando o leitor e/ou o estudante. Por exemplo, e se o aluno descarregar um livro para o seu MP3 e se decidir por este método de estudo? Acaso será negativo? O aluno pode estar a ouvir nos intervalos, nas deslocações,… Ficará resolvida a sua função de aluno? Claro que não. Há outras vertentes mas esta não será também de descurar. Até porque o autodidactismo não resolve tudo e não é uniforme nem em pessoas nem em áreas científicas ou técnicas. Mas poderá juntar-lhe ainda a imagem animada, o som próprio … e os seus sentidos despertam mais intensamente para o processo de aprendizagem. Agora que estamos perante um explosão de meios, de percursos e de desafios…
Onde me parece pertinente a utilização dos e-books, sobretudo neste momento, é o relativo a consultas de enciclopédias e aquele que exige o contacto com documentos muito delicados! Parece-me ser de rejeitar o contacto directo com determinados documentos cuja utilização podia agravar a sua deterioração e utilizar o fac-simile (é também o livro tipográfico) ou a sua reprodução digital. Em matéria de Enciclopédia, ganha-se tempo e é mais fácil aceder a conteúdos inter-relacionados, sem contudo cair num hipotético mundo labiríntico. Também o acesso rápido e fácil é uma função interessante. Mas há prazeres que vão custar a ser superados pelo computador… manuscrever no próprio texto, sentir o virar da página! Alivia quem transporta os livros – veja-se o caso das crianças que se vergam ao peso de mochilas desproporcionadas – e faz ganhar espaço em bibliotecas públicas e privadas. E o livro tem um fim anunciado? Há quem diga que sim, mas também muitas profecias não se t~em concretizado. Até quando?
Umberto Eco, que defende a complementaridade do formato papel e do digital, pensa que as novas tecnologias não devem ser encaradas de maneira simplista a ponto de nos vergarmos ao moderno e «é tudo novo». Para Eco, se os e-books são um paradigma da actualidade, também se devem às TIC a produção de inúmeros materiais impressos que depois são difundidos de maneira prática e rápida e tornados também mais dimensionados e até inter-activos. São exemplo desta característica, as acusações de plágio que aqui e ali vão surgindo, a capacidade que se dá aos leitores para escolher o «happy end» ou o seu invés relativamente a uma estória. É a nossa liberdade e criatividade que se estimulam, o que se tornará extremamente importante à medida que o tempo passa! E convém ter presente que o próprio livro terá sido encarado de maneira semelhante em Quatrocentos. É o fim do magister dixit que a pedagogia há muito abandonou? Não deixa de ser interessante rematar com este pensamento do próprio Eco: “Todos estes textos fisicamente movíveis dão-nos a ilusão, como leitores, de uma liberdade absoluta, mas é apenas uma ilusão. A máquina que nos permite construir um texto infinito com um número limitado de letras já existe há muito tempo: é o alfabeto.”